[Edição #7] A vida que a gente não posta...
... continua aqui, sendo vivida. E muito mais bem vivida, se você quer saber.
Na esteira dos trágicos eventos de maio aqui no RS, comecei esta newsletter.
Entrei aqui me propondo a escrever toda semana.
Pouco tempo depois, a realidade se impôs, e, pra não tornar a escrita - justamente um dos meus mecanismos terapêuticos mais eficientes - mais um gatilho para ansiedade, passei a publicar quinzenalmente.
Só que essa coisa de ser aspirante a escritora nas horas vagas, quando estas quase não existem no meio da rotina entre filho, casa e (cada vez mais) trabalho, foi algo bem ousado da minha parte, viu.
Então, agora, a newsletter vai sair sempre no domingo à noite, pra talvez dar um quentinho no coração de algum outro "angustiado” do dia (que é o pessoal do meu time, o da angústia dominical, como bem disse a
).Então vamos de coisas leves e aleatórias no domingo à noite, e deixa pra pensar nos pesos da semana quando o despertador tocar na segunda de manhã (tudo bem, pode pegar a agenda hoje pra programar a semana, vai, mas vai com calma; faz isso enquanto escuta tua música preferida ou comendo um bolinho, pelo menos ☺️).
No último mês, me afastei quase completamente do Instagram (a única outra rede que uso de fato, além daqui). Publico muito pouco e depois não volto lá pra ver o retorno.
Decidi fazer isso depois de reler uma frase que escrevi no meu bloco de notas há algum tempo: “parece que está todo mundo vivendo, menos eu”.
Depois de mais de um mês dessa espécie de libertação, eu percebi que não é que eu não estivesse vivendo. O problema é que eu estava comparando o que eu vivia com o que os outros escolhiam mostrar.
E lá vai mais de um mês sem ficar olhando curtidas, sem nem mesmo responder reações, mensagens e comentários. Mais de um mês sem me sentir constantemente insuficiente.
Sinto falta de ver as postagens das pessoas queridas, é verdade. Mas hoje vejo o quanto é incrível a quantidade de tempo que sobra pra realmente viver quando a gente para de ficar naquele scroll infinito de recortes nem sempre reais da vida dos outros.
A vida que a gente não posta continua aqui, sendo vivida. E muito mais bem vivida, se você quer saber. 😊
Uma das melhores coisas desse afastamento das redes sociais foi a quantidade de tempo livre que me "sobrou” (que, na verdade, eu sempre tive).
E esse tempo foi muito bem aproveitado colocando a minha fila de livros pra andar.
Em julho, a fila já tinha andado bastante:
Tudo Sobre o Amor (bell hooks): o tema, que é o amor e como viver numa ética amorosa torna seres humanos e sociedades melhores, é até meio óbvio. Mas, como o óbvio precisa ser dito, a Bell escreveu um livro inteiro sobre como amor é ação e não só um sentimento. O que, com certeza, é algo que poucos de nós conseguem compreender completamente.
Fernão Capelo Gaivota (Richard Bach): um clássico publicado em 1970, sobre ser quem você quiser ser e não quem os outros querem que você seja.
Vista Chinesa (Tatiana Salem Levy): em diversos trechos do livro, tive que me lembrar de respirar. A escrita expressa exatamente a sensação dos pensamentos confusos e sucessivos. Dá pra sentir a angústia e o desalento da personagem depois da violência sofrida. A sensação de querer morrer e, ao mesmo tempo, agradecer por estar viva. E a história (baseada em um fato real) embrulha o estômago. Dá um aperto no peito. Cresce uma raiva de viver num mundo em que uma atividade trivial pode virar um pesadelo somente pelo fato de você ser mulher.
Notas Sobre a Impermanência (Paula Gicovate): conforme a leitura avança, a gente vai percebendo a mudança dos pensamentos, dos sentimentos da protagonista. Um livro sobre a impermanência das coisas, que podem mudar assim que você muda algo em si mesma, lembrando que é você que muda, não as coisas ao seu redor.
Meu Coração Diz Teu Nome (Cris Lisbôa): com as palavras mais lindas, a autora narra o desafio de não se encaixar no que é tido por “normal” para o mundo. “Que nas mãos de um coração, tuas vulnerabilidades se transformem em estrelas, não em munição”.
A Coragem de Ser Você Mesmo (Brené Brown): neste livro, Brené discorre sobre o verdadeiro pertencimento, que nada mais é do que pertencer a si mesma. Firmar-se sozinha, atravessando a natureza selvagem que é ser você mesma num mundo que constantemente tenta te rotular, te adequar, te reduzir.
A Palavra Que Resta (Stênio Gardel): uma das melhores leituras dos últimos tempos. Um homem analfabeto com uma carta escrita há cinquenta anos, por um amor antigo e proibido. Carta que ele nunca pode ler escrita por um amor que ele nunca pode ter. Uma carta que o moveu a vida toda, inclusive pra um novo começo. Tocante, chocante, triste, bonito.
E, em agosto, andou mais um pouco:
Um Quarto Só Seu (Virginia Woolf): num dos textos mais influentes do século XX, a autora fala da relação entre a condição social das mulheres e sua participação na literatura. E faz pensar sobre como o fato de, século após século, termos sido enclausuradas nas condições de mães e donas de casa, sem autonomia financeira e educacional, nos deixou relegadas a um plano quase inexistente na literatura por muito tempo.
A Gente Mira no Amor e Acerta na Solidão (Ana Suy): pra quem gosta de temas relacionados à psicanálise, a Ana Suy coloca o tema com muita simplicidade, falando principalmente de como somos essencialmente sós no mundo, inclusive quando nos relacionamos com alguém, e que a solidão não necessariamente é ruim. Pra mim, ela conseguiu "desenhar” coisas que eu há muito tentava entender… 😅
E, por fim, teve O Perigo De Estar Lúcida, da Rosa Montero.
Eu ainda não tinha lido nada dela. E agora quero ler todos os livros que ela já publicou na vida.
Que escrita, gente. Que processo criativo fantástico o dela.
Rosa começa o livro expondo sua vulnerabilidade (as crises de pânico), e assim já busca a conexão com quem a lê, trazendo a leitora pra dentro de uma envolvente análise sobre a relação entre a criatividade e a loucura. É incrível como a autora consegue tornar um livro sobre dados e fatos quase um thriller, mesclando a vida pessoal dela com a análise da tênue linha entre os dois conceitos.
Várias vezes, durante a leitura, nas partes em que a Rosa fala dela mesma, do processo criativo dela, me peguei pensando "mas é exatamente assim que a minha mente funciona!".
Seria eu lúcida na minha loucura? Ou haveria um pouco de loucura na minha lucidez?
Como eu disse, linha tênue.
E, falando em lucidez, chamou minha atenção o que O Perigo de Estar Lúcida traz sobre a consciência da morte, pois me lembrei de duas das minhas últimas leituras: A Gente Mira no Amor e Acerta na Solidão, da Ana Suy, e o Tudo Sobre o Amor, da bell hooks.
Bell diz que precisamos saber que a morte existe para aproveitar o agora. Entender que a morte está sempre conosco pode servir como um lembrete fiel de que o tempo para fazer aquilo que queremos fazer é sempre agora, e não algum futuro distante e inimaginável.
Já Ana diz que não precisamos ter consciência da morte o tempo todo, sob pena de deixarmos de viver. É preciso que não sejamos tão lúcidos para que possamos aproveitar a vida.
Em resumo, para Ana, é preciso perder um pouco da lucidez pra continuar vivo, que é essencialmente o que diz Rosa Montero, no O Perigo de Estar Lúcida. Lucidez demais acaba com a criatividade e, com o isso, o prazer de viver (que, no caso do escritor, se dá pela escrita).
Ao fim e ao cabo, o que as três autoras dizem é que devemos saber que a morte existe, e, por isso, devemos viver o presente. E, para isso, é necessário que não tenhamos consciência da possibilidade da morte o tempo todo, ou corremos o risco de não viver, paralisados pelo medo de morrer.
É o tal "perigo de estar lúcida".
📝 Vi, li e ouvi. E gostei.
Depois de terminar a segunda temporada da The Newsroom (Max), resolvi dar um tempo antes de começar a terceira e última (gostei tanto da segunda que quero aproveitar mais um pouco esse sentimento, caso eu venha a me decepcionar com a terceira… 😅). Então resolvi começar a assistir O Urso (Disney+). E terminei a primeira temporada A-MAN-DO a série.
Ouvi Liniker pela primeira vez, o álbum que acabou de sair. E concluí que eu tenho que perder esse péssimo hábito de escutar sempre as mesmas coisas, porque o que eu perco de coisa boa por aí “não tá no gibi" (expressão que os 40+ entenderão… 🫣).
No texto Que cara a depressão tem?, a Fê Pandolfi fala, a partir de sua experiência pessoal, sobre como é silenciosa essa doença, que pode surgir pelos mais variados motivos, que não somente a tristeza.
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Minhas notas aleatórias sobre maternidade, relacionamentos, cultura, feminismo, empoderamento, política. Com dicas de livros, séries, filmes, música, podcasts. Sobre o meu cotidiano como mulher e mãe solo e minhas reflexões sobre os mais diversos assuntos e acontecimentos. Com minhas (tentativas de) crônicas, minhas histórias de viagem. Minha lente de aumento sobre as miudezas do dia a dia.
Tudo em textos curtos, pra ninguém cair no sono no meio da leitura. E leves, porque de pesada já basta a vida.
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Até o próximo domingo.
Um abraço.
Lu Cadore
Estou finalizando Rosa Montero e quero muito ler A palavra que resta. Tá aqui na fila.
Um beijo, Lu
Adorei a edição, Lu! A Rosa é fascinante! Tô lendo a louca da casa e tô achando que esse livro foi a semente do perigo de estar lúcida. Muitas histórias que ela conta no perigo, já estavam na louca.
Ahhh, eu também amei demais o livro A palavra que resta! Encantador! ✨
Beijos, Lu e boa segunda! 🩷